terça-feira, 22 de março de 2016

No dia que me tornei o desprezível homem invisível


Há muitos modos de se desprezar uma pessoa. Nem sempre esse comportamento vem com uma agressão ou com algum tipo de violência simbólica. Por vezes pode vir com muita cortesia. Outras vezes pode vir do não gesto, quando simplesmente fingem que você não existe. São formas sutis no qual seu interlocutor colocando-se na posição de superioridade, simplesmente, despreza a possibilidade que o outro é dotado de inteligencia e de sentimentos que lhe dá uma particularidade do mundo.
Estou no Recife a quase vinte anos, e até hoje vivencio estas várias formas de desprezo. Não tenho vergonha de assumir uma condição social e de informa o meu local nesta sociedade. Sou um pouco daquela música do adorável Belchior: “Eu sou apenas um rapaz, latino-americano sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo do interior...”. Também, não tenho vergonha de me colocar como um trabalhador pobre e que passa por todas as vicissitudes que as pessoas mais simples passam no seu dia a dia. Na minha vida encontrei mais pessoas dizendo que não poderia, do que pessoas dizendo que eu poderia, e a razão dos primeiros nunca me veio como uma justificativa minimamente racional, senão as mesmas que colocam as pessoas em posições estanques pelo simples fato de não serem ninguém importante. Isso é uma forma de desprezo. Mas não quero falar apenas disso. É preciso ir além e vou além!
Talvez, pela minha história e pela própria ‘natureza’ aprendi a dar significados aos gestos sutis de desprezo, e daqui incluo em todas as suas formas – do modo especial àquelas mais sutis que desprezam nossa inteligencia e das nos ignoram. Entendo, perfeitamente, o que é lhe com uma aristocracia preconceituosa e retrograda, que mesmo estudando nas melhores escolas não foi capaz de abandonar os vícios do passado sob o medo de não ter que dividir espaços com um matuto do interior – como este aqui se manifesta. É inegável a superioridade – se falarmos das representações sociais – no entanto, o que fazem não é apenas um manifesto desprezo a quem julgam desprezível e/ou mesmo sem importância, mas assinam no mundo da vida o selo de um modelo de sociedade que nos puxa pra baixo.
Aos que me desprezam termino completando com a mesma letra de Belchior:
“Mas não se preocupe meu amigo com os horrores que eu lhe digo,
Isso é somente uma canção, a vida realmente é diferente
Quer dizer, a vida é muito pior...”

A vida realmente é muito pior, eu sou apenas o cantor (escritor) porque a noite eu tenho um compromisso e não posso faltar por causa de você (Belchior). E de fato, assim como tenho lutado não faltarei as minhas convicções e a tudo que aprendi a valorizar. Por que para mim, o mundo não é aparência, não é o status quo. A vida é algo mais que o simples desprezo. É a intimidade com o indivisível é o compromisso com as minhas convicções, com meu mundo. Portanto, a intencionalidade do desprezo pra mim um significado, do qual valorizo. Ela nos coloca na real condição de nossos valores e de nossas diferenças.

Acho que vale a pena escutar Belchior
 

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