Uma hora da manhã. Acordado por paixão, diria. Lendo àquilo que
considero interessante, mesmo diante do desapontamento que é viver
em condições precárias e com poucas perspectivas. Pensando sobre
esse tempo, de grandes dificuldades. Imaginando que minhas crenças e
meus sonhos parecem está muito mais próximos do passado que nunca
vivi, do que do futuro que me aguarda – embora, pretenda
projetá-los na frente. Na minha mesa sob a luz da luminária um
pequeno livro, de um dos intelectuais que tenho admirado por sua
perspectiva de pensar o mundo. Longe dos preconceitos academicistas e
de todas os dogmas do que chamam ciência, penso que Wrigth Mills,
ainda hoje, está a frente do que preconizava como sendo a atividade
intelectual como um artesanato.
O princípio me convence, por um
critério simples: não me vejo em círculos de intelectuais
conversando difícil, teorizando sobre tudo e sobre todos e, tirando
conclusões que só cabem para eles mesmos. Por que não escrever
simples e para todos? Por que não escrever sobre algo que esteja ao
alcance de todos? Eu não sei fazer isso, mas acredito e almejo. Daí
buscar como um discípulo, busca no verdadeiro mestre – aquele do
ofício e/ou do artesanato -, lições sobre sua arte, buscando –
com liberdade – seu próprio jeito de desenvolver sua arte.
Essa não é uma tarefa fácil. Muito mais fácil é ser acadêmico
no decoreba de regrinhas, métodos e todo um modo de pensar - que só
pode ser 'àquele', se não você não é aceito – do que
propriamente, se descobrir num modo próprio de ser na escrita, na
literatura. Um artesão e seu artesanato. Falo da literatura e dos
campos da escrita, mas pode ser, facilmente, empregado em todos os
campos de atuação. Basta compararmos os melhores profissionais em
todas as áreas de atuação. Há coisas que só determinadas pessoas
têm e, por mais conhecimento que outros venham a ter na tentativa de
se comparar não alcançam. Isso acontece com àquele garçom pelo
qual todos querem ser atendidos por ele, ou o médico(a) que todos
procuram por uma série de qualidades que estão muito além de um
metiê profissional. E aqueles empresários notáveis que começaram
do nada e se transformaram em referências de sucesso para muitos, em
contrastes com àqueles que se julgavam de sucesso e espantam os
demais pelo fracasso? Enfim, essa lista sobe o fazer, saber fazer,
segundo Mills, também, está muito associada a um aspecto
fundamental de nossa existência: a construção de nosso ser.
Se tenho convicção que estou propenso à ser engenheiro, não
adianta enveredar para filosofia só porque poderia dentro de um
cálculo achar que me daria melhor. Isso pode parecer simples, mas só
aparência. Numa sociedade que tudo se converte em número e/ou em
algo que tem que apresentar uma função esse é um princípio cada
vez mais deixado de lado (aplica-se isto a todas as áreas),
portanto, pensar naquilo que se faz como uma arte – independente do
campo que atuamos e vivemos – é um gesto que não cabe a
racionalização do mundo que vivemos. Talvez, por isso, que não
vejamos tantas novidades e fiquemos em práticas conformadas por
regrinhas (no meu caso, acadêmicas). O que seria esta falta de
criatividade, se não o olhar pragmático e de coisas rápidas, de um
tempo superficial com nenhum espaço à imaginação e ao novo?
É por conta dessas questões que penso viver num tempo desconexo de
minhas crenças, daí o meu flerte com o artesanato.
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