sábado, 3 de outubro de 2015

Para que servem os holofotes, senão para mudar de foco?


Esses dias pensei bastante sobre a censura. Muita gente associa a sistemas que não são democráticos. Logo a contar por nós, que não somos democráticos. Mas não é por isso, que tomarei a posição de afirmar que vivemos sobre censura. Os covardes que ficam calados, porque temem, ou porque são covardes mesmo, não vivem censura. Os que falam o que é conveniente as estrutura do poder, também, não vivem censura. Mas o que é censura. Primeiramente, não trato sobre a perspectiva da lei, muito embora os seus sentidos apontem para ela. Como um curioso sem futuro, tomo como referência os seus sinônimos, que apesar da variância, todos apontam para um estado de que algo dito afronta uma ordem e/ou perspectiva. Não quero relacionar diretamente com liberdade de expressão, por associada a outra coisa, por sinal bem mais trágica em nosso contexto. Denoto ao estranhamento e ao banimento – como consequência – de todos que passam pelo constrangimento da censura.
Muitos podem pensar que os censurados são os escritores, blogueiros, artistas de um modo geral. Na verdade os holofotes da censura brilham mais sobre eles, mas não está restrito ao seleto grupo. Portanto, não quero me referi ao seleto grupo. Penso no aspecto da censura que tende a dominar o cotidiano na sua forma mais simples. Não se trata, apenas do politicamente correto, mas é fato que hoje falar o que pensa é tão ou mais perigoso que tempos passados. Duvidam? O que é o silêncio que assistimos de pessoas ditas esclarecidas, senão o medo da censura? Mas não pensem que virá um inquisidor e perguntar sobre todos os sentidos de suas palavras (embora não faltem pessoas para isso). A censura pode está presente num jogo sútil de palavras, gestos e modos de organização que impedem as pessoas de se expressarem naquilo que elas são. De se manterem verdadeiras e dignas em sua existência enquanto pessoa. É este medo que hoje tende a legitimar condições sub-humanas, sob alegação que nada é possível para além do que vem como estrutura.
As pessoas nos seus bairros, nas suas comunidades, muitas vezes no seio da própria família se veem censuradas, com o medo das consequências sobre si e os seus. O silêncio de bairros violentos, pode ser um exemplo, mas pode ser, também, o medo em propor e defender aquilo que acreditam e/ou mesmo afirmarem aquilo que acreditam. A censura pode vir do receio que as pessoas tem de se colocarem em campos de diferenças, das crenças, dos valores, enfim, de expressão daquilo que as pessoas sentem, mas o medo da ira alheia, da perda e até mesmo de consequências no plano das sociabilidades, convida a todos a um gesto de não expressão. E pasmem! Nunca fomos tão democráticos nos planos institucionais e ao mesmo tempo assumimos, tacitamente, a censura como um plano que legitima o vazio jogo das conveniências. E se por acaso, algum tolo venha a achar que a censura é coisa de artistas, saibam que paira apenas os holofotes que desviam o foco da verdadeira censura.
Mas não disse que o era censura – pelo menos como a formulo, neste momento. Primeiramente, censura é um estado de opressão. Se existe o respeito as diferenças - por mais duro que as vezes possa parecer -, não existe censura. Se os papeis sociais e as estruturas de poder (me refiro a ideia de micropoder) estão bem definidas, o dissenso seria a dádiva e não a maldição a ser combatida. Quando não a censura, há, igualmente, menos gente dissimulada, menos lacaios. É por isso que onde há o medo, há, também, traição. As pessoas não estão seguras de si e, por medo de se revelarem, cedem facilmente a pressão. Mas o que é a censura, senão todas as vezes que escuto que devo ficar calado, ou nas vezes que não fico calado e vejo pessoas caladas – muitas vezes imoveis para não dá a pinta que podem está concordando comigo.
Talvez aos bonzinhos e caladinhos estejam certos. A censura é algo que nos abate profundamente, por vezes, nos chega a nos colocar de joelhos. O vazio, o silêncio e a solidão é a característica dos censurados, mas o tempo, também, pode ser a recompensa daqueles que não se vendem e nem se rendem ao vazio jogo das conveniências. Por isso, penso que ainda não somos um povo livre e nossa desarticulação provem de uma suposta neutralidade, mas principalmente, do medo, de um eterno estágio de vigilância em sermos “bonzinhos”, fingindo que vivemos num mundo de “bonzinhos”, mas sem darem-se conta que a percepção do mundo, deve ser, igualmente, a soma daquilo que somos. Isso é difícil porque implica viver com a diferença, daí - talvez – seja melhor censurar do que partir para o bom jogo do convencimento, que diga-se de passagem não existe quando a censura é a regra.

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