Minhas palavras soam como tendenciosas neste momento, mas sou
fanático pela literatura. Dostoiévski, Émile Zola, Gustav
Flaubert, Jack Kerouac, Machado de Assis, Jorge Amado, Gabriel García
Marques, Vargas Llosa e tantos outros que poderia estender uma lista
de páginas. Todos escritores geniais. Escritores, que a sua maneira,
fizeram arte e, para além da arte, refletiram do modo particular e
profundo o mundo que gostariam e o mundo real. Um jogo de palavras
difícil e para poucos. Teve épocas que tentei, mas percebi o quanto
são geniais. Lembro dos trinta dias que passei mergulhado na leitura
de Tolstói e Dostoiévski, perceber o quanto a arte é capaz de nos
levar à uma outra dimensão da existência. Na ocasião estava de
férias do trabalho e no domingo que antecedia o retorno de minha
volta a única coisa pensava era “como é possível?” Não
bastasse esses dois autores viscerais, numa semana intercalo com a
leitura de Madame Bovary, de Gustav Flaubert.
Mas tem os autores nacionais. Falar de Machado de Assis é cliché.
Já li de alguns críticos que se fosse russo ou americano ganharia
status de universal. Posso está falando uma grande bobagens, mas
Machado é universal, porque trata de temas universais. Mas não
posso esquecer de José de Alencar e, muito menos, de Aluísio de
Azevedo. A primeira vez que li “O Cortiço” morava num cortiço.
Naquele momento nem um tratado de ciências humanas era mais
importante do que aquele livro. Na precariedade da vida, ainda mais
perdido do que hoje, lia o Cortiço enquanto comia um
cachorro-quente, de frente ao Centro de Filosofia. Enquanto Carlos
prepara do dog, folheava as páginas de trás pra frente, numa
retrospectiva de cenas entre o imaginado real e o real imaginado, no
ir e vir de estudantes de classe média preocupados com “A grande
revolução”, enquanto comia minha única refeição e procurava,
estranhamente, entender a “natureza” de um escritor. Naquele
momento Aluísio de Azedo.
As dúvidas ficaram. O livro guardo com carinho especial, com manchas
de um passado, Lembro até a hora. Meio-dia. Sol quente. Movimento
intenso de ônibus e as mesmas discussões como fazer a “grande
revolução”? Eu só queria entender o cortiço, literalmente.
Talvez, porque essas coisas nunca foram para mim. Até hoje sou muito
ignorante para isso. Esse pessoal que pensa na “grande mudança”
é “descolado”, inteligente, cultos e sabem o que é melhor para
o povo. No auge dos meus 64 quilos pretendia ter apenas um pouco da
força do Jerônimo, porque o Rio Doce/CDU nunca foi moleza. Graças
a Deus foi coisa rápida.
Mas outras leitura vieram, igualmente, em outros tempos diferentes, a
exemplo de Hemingway. Neste autor a sofisticação do ponto. Nunca
aprendi direito. Da sofisticação do ponto passei para a prolixidade
dos longos parágrafos de Jack Kerouac. Graças a Deus só cheguei a
lê este autor depois - vamos dizer – velho, aliás velho para o
que este maldito escritor nos conduzir. Acho que é devido a Kerouac
que gosto de viajar de motocicleta, parar em alguma lanchonete de
beira de estrada e tentar trocar nem que seja duas palavras com outra
pessoa. A sensação de desconfiança deve ter sido a mesma que os
malditos beatniks viviam. Andar sozinho na estrada sem olhar pra
trás, apenas pra frente. A velocidade não é importante. Importa o
ritmo. Após Keouac o jazz é o ritmo. Imprimir a mesma constância
entre o ritmo da música e do motor. O improviso perfeito, seguro
porque é harmônico. Já perceberam que motociclistas barulhentos
são os piores? Não há ritmo.
Não poderia esquecer Milan Kundera em “A insustentável Leveza”
e a “Imortalidade”. Na ocasião trabalhava como auxiliar de
pesquisa e um grupo de doutorandos passava no corredor do
departamento onde trabalhava, e como sempre, entre às 12h30 e 14h
sentava no banco para lê. Nesse dia viram que minha leitura não era
manual de revolução ou qualquer tratado contra o capitalismo,
tratava-se de Milan Kundera. Encarei os risos e deboches com
indiferença, ao mesmo tempo que lia em Kundera na sua crítica aos
intelectóides de esquerda, sempre tão carentes de espelhos, na
busca de uma pseudo imortalidade. Até hoje vejo como um livro
importante. A Imortalidade me fez pensar no princípio “uno-e-terno”
de Deus. Em Kundera aprendi que todo sintoma de autoritarismo e
ironia é sintoma grave de fraqueza e medo eterno do esquecimento. E
com quantos desses não temos que conviver ao longo da vida?
Como disse lá no começo: é tendencioso meu argumento pela
literatura. Ao tratar disto quero apenas mostrar uma perspectiva
entre tantas possíveis, em especial em tempos tão carente de arte –
aqui incluo todas as artes – no qual a criatividade tem se rendido
ao pragmatismo do tempo e do dinheiro. Diga-se de passagem sintomas
de muitos de nossos problemas sociais, políticos e econômicos do
qual passamos., mas deixa isso pra lá porque é outra história.
Fui!!
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