Texto
escrito fora do exílio (Postado a partir do exílio, meu lugar
preferido).
Tive
a grata oportunidade de assistir o filme Hannah
Arendt. Muitos colegas e conhecidos disseram que
tinham assistido e limitavam-se sempre a dizer: “Ah, muito bom esse
filme!” Devo agora dizer que concordo com eles mas, não tomarei
como argumento para falar do filme com o mesmo jargão. Não
classificarei como “muito bom!” Digo apenas: reflexivo. Não é
um filme para se dizer apenas: “muito bom!” Acho isso muito pouco
diante da qualidade da história que nos é repassada. Não vou
narrar a história do filme por considerar uma coisa chata e, se por
acaso, alguém se interessar recomendo assisti-lo. Não vai se
arrepender.
O
que ficou pra mim é algo que está corrente na sociedade atual. O
que vivemos é, realmente, a verdade? Até que pontos estamos abertos
a enxergar a realidade de forma abrangente e crítica, mesmo que isso
vá de encontro às nossas questões mais pessoais e/ou quando
envolve nossas escolhas? Confesso que não sei se isto é uma
reflexão pertinente a um sociólogo de quarta divisão, como este
que escreve. Tenho plena consciência que a realidade como está
posta é algo incontestável, independente da posição política e
ideológica. Nos últimos dias tenho pensado nisso. Muitos dizem que
isto não é mais o relevante. … Em parte isto é verdade, em parte não.
Apesar de vê a gestão do PT com sérios problemas e de ter me
decepcionado em muitas questões, tenho que considerá-lo como um
governo de esquerda, mesmo quando escuto neoliberais argumentando que
esta é uma tendência. Na verdade acho tudo isso muito pequeno e
irrelevante. Mas o que me deixou pensativo foi sobre o papel do
pensar e de construir algo a partir do pensamento e, é justamente
neste ponto que está minha crítica. Pouco importa a posição do
indivíduo ou daquilo que ele faça, mas é importante que ele saiba
o que está fazendo e, que não se torne apenas um burrocrata do
sistema e que faças as coisas porque assim a sociedade está
determinando. Aliás, determinado de determinismo. Ou seja, de coisas
que não podem, em hipótese alguma, serem questionadas.
Quantas
coisas hoje se tornaram inquestionáveis? Isso está diretamente
relacionada à nossa covardia em tomarmos uma posição. Agimos pelo
que é mais conveniente e, encontramos a partir disso nossas
justificativas. Vejo o impulso do consumo como um modelo de
felicidade como um belo exemplo. Lembro, por exemplo, de uma pergunta
que um ex-colega e amigo me fez:
“Vai
dizer que se pagassem uma grana boa você não iria trabalhar para
aquela bandeira?”
Ou
seja, basta que você faça a coisa da maneira mais 'profissional'
possível que estará tudo bem. Infelizmente naquela época era ainda
mais tolo do que sou agora e, por isso, não tinha palavras para
responder uma questão dessas – apesar de não concordar com o
argumento. E assim, vamos agindo em função dos interesses pessoais
- que devem acontecer - mas, não nos damos conta de pensarmos sobre
estes ou pelo menos negamos algo tão próprio de nossa condição
enquanto 'categoria' que chamamos de 'seres humanos'. Nos colocamos
nessa categoria numa posição de superioridade e nos damos o direito
de usá-las sem a responsabilidade necessária. Matamos a natureza,
destruímos todos os dias um pouquinho de nossa saúde, engolimos
todas as porcarias que nos passam em força de conteúdos e/ou de
valores, colocamos as normas em valores de ordem, num lugar de
autoritarismo da fatalidade, quando a única fatalidade que
deveríamos ter presentes é a morte que vem pra todos, mas que todos
negam - por meio de padrões estéticos que nos deixa todos
iguaizinhos – do mesmo modo que foi proposto por governos
autoritários.
Quando
falo em pensar, não me refiro apenas a categoria que estava presente
no filme – até porque esta é mais sofisticada e, por isso,
filosofia. Pensar, neste caso, pode ser a própria possibilidade que
temos de pensar nossa existência, nos deparando com problemas que
podem ser inevitáveis. A fome, a pobreza, a doença, as dores que
relaciono como remediáveis, mas que ao bater em nossa porta podem
ser inevitáveis (pelo menos num primeiro momento). Sentir a dor de
qualquer uma dessas questões pode nos exigir um tempo, àquele
necessário que só nos conhecemos pra nos recuperarmos e, aqui vem o
dado importante: de algum lugar é preciso repensar a existência e,
assumi-la pra si ao invés de culpar o(s) outro(s). Esse filme me
levou a pensar nessas questões. Se estou certo? Acho que não sou o
mais indicado para escrever sobre isso. Conheço, em parte, minhas
limitações. Esta é uma delas. Ao contrário de muitos covardes que
conheci sempre me posicionei sobre as questões que se colocam sobre
mim e, ao contrário dos que muito pensam, sempre aceitei e sempre
fui leal àqueles que discordam de mim. Estes são os melhores para
se surpreender positivamente. Os outros não. Se afastam se as coisas
não estiverem bem. Bom! Mas isto não tem a menor importância. Pra
mim ficou muito mais que “muito bom!” Por enquanto é isso! Estou
com poucas ideias, ando pensando sobre …
Obs.:
Ah! Só pra não passar. Para Arendth o importante não era apenas
julgar Adolf
Eichmann, mas o sistema, suas instâncias
burocráticas e totalizantes. O que ela demonstra é que o Estado
pode ser tão totalizante que pode tirar do homem a capacidade de
pensar, refletir. Até que ponto o capitalismo (ou o sistema que
estamos inseridos) se totaliza sobre nós? Parece que nesse tempo de
poucas utopias, o imediatismo tem se constituído uma arma eficaz no
gerenciamento de nossas atitudes.
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