Pessoal andava meio cansado.
Elias, por exemplo, disse que não voltaria à Picuiá sem antes
dormir duas noites na Capital. Quem ficava sabendo da notícia não
acreditava. Foram cinco andares abaixo. Felizmente e, graças aos
equipamentos de segurança, não teve maiores sequelas. Apenas a
desaceleração que serem causa uma dor terrível sobre o corpo.
Mesmo assim foram longos dias no hospital. Segundo o próprio Elias
sentia a cabeça pesar 200 quilos. Talvez por isso não tinha tanta
pressa pra voltar pra casa.
Queria fazer uma visita aos
Colegas. Simone – prima que veio para tentar passar em medicina
dividia as despesas com Elias, sempre o acompanhava. Fez questão de
voltar ao local do acidente com o primo, temendo talvez alguma reação
dos 'capitães do mato' que faziam a guarda do local. O medo não era
a toa. Desde que tinha acordado do grande susto tinha jurado pegar um
dos capangas. Caído no chão sentiu o peso e a indiferença de um
deles. Segundo testemunhas os chutes que tinha levado no estômago
doía-lhe mais que o baque.
Desde a saída do hospital até
alguns dias dentro de casa fez tudo lentamente, do mesmo modo que
segurava por horas a fotografia de família. Os dois filhos pequenos
e esposa num típico domingo, num momento raro que saiam de casa até
o restaurante. Queria apenas dois dias e poderia jogar na mala porta
retrato.
Como tinha decidido visitar os
antigos colegas aproveitaria, igualmente, pra ver novamente o jagunço
que lhe chutara as costelas. Escolheu horário que não tinha mais
tanto engarrafamentos nem ônibus lotados, apensar de ter ficada no
ponto por cinquenta e quentes minutos. Durante a espera reviveu
alguns anos de trabalho entre apertos, greves, protestos e tantas
broncas por não ter chegado no horário combinado. Milhares com
pressa e na mesma quantidade e proporção lá estão os mesmos,
sempre atrasados. Não é apenas no tempo, mas na compreensão da
própria vida. Elias percebera isso da pior forma. O teto branco e
ventilado girando lentamente, sem pressa cumprindo sua função.
O local da construção tinha
sido implodido ao custo de duas prisões. Funcionários que
misteriosamente assumiram terem acendido à primeira hora do dia de
um sábado os dinamites. E quanta história virou pó em 15 longos
segundos. Poderia ter sido uma bela manhã de sol de sábado. Com
bares cheios de estudantes e trabalhadores festejando os encantos do
verão, não fosse o grande vazio deixado. Mas já estava certo!
Elias tinha posto seu currículo via e-mail e, quase num automático
tinha sido selecionado – entre outras dezenas de homens – para
uma obra numa cidade distante.
Eles não sabiam e, mesmo Ele, já
vendo de longe os colegas levantando tijolos, percebia só agora o
quanto o local era bonito. Todos àqueles espaços seriam tomados por
pessoas com dinheiro e poder. Ao chegar percebeu algo diferente. Ao
invés das cercas que protegiam o local, ergueram muros altos
protegido com cercas elétricas. Em casa extremidade uma guarita com
vigias fortemente armados. O acesso se fazia agora por uma portaria
com uma recepcionista, bastante educada e bela. Recepção que
contrastava com dois seguranças portando submetralhadoras.
Já esperado.
“Bom dia, Senhora” disse
Elias a recepcionista.
Antes de qualquer resposta e sem
esperar um dos guardas aproxima-se do antigo funcionário pedindo que
se retire o quanto antes daquele local. Elias sabia que pelas
condições não teria a menor chance de nada. Saiu lentamente pela
calçada. Alguns metros depois era possível avistar, do outro lado
da rua, famílias alojadas em cima de calçadas morando em caixas de
papelão. Como despedida da cidade sentou num bar tradicional da rua.
O mesmo que costuma frequentar às sextas-feiras. Pediu uma cerveja.
Depois disso seguiu pra casa arrumou a bolsa. Dois dias depois estava
em casa. Será que agora colocaria sua vida no eixo? Parecia decido
recomeçar a vida, no entanto, notou que algumas coisas tinham se
modificado. Perceberia, mas tudo é uma questão de tempo.
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