Nove horas da manhã, muito sol pra variar. Mesmo cansado, por uma noite mal dormida, saímos em busca de resolvemos questões peculiares. Os ônibus, como sempre nesta cidade multicultural e maravilhosa, lotados, cheio de pessoas indiferentes a lotação e o sofrimento habitual mas, o que importa tudo isso? É provisório. Compro meu carro e pronto! Por isso seguimos todos os dias nesses tumbeiros ao nosso trabalho, tão digno. Enfim, chegamos. Resolvemos tudo tão rápido, seguíamos pra um lugar mais distante. Onze horas da manhã, o chão a ferver, a boca sedenta pede algo pra aguentar as intempéries. Avistamos um quiosque de água de coco.
Duas águas, por favor – pedi
Tamanha a sede que rapidamente sequei o coco. Esperava que A. bebesse, também, o seu. Enquanto aguardava chega uma mulher que pergunta o preço:
dois reais – disse o vendedor, enquanto recebia o pagamento pelas duas que acabará de abrir.
Eu quero – respondeu a mulher que parecia assustada.
E, estava mesmo assustada. Um homem, aparentando ter uns trinta anos, sujo e vestido apenas com bermuda vermelha aproxima e diz para todos:
Me dá um dinheiro, qualquer moeda.
Fiquei bastante assustado pela maneira como fez a abordagem. Chegou muito próximo de mim. Tinha, de longe, visto puxar a carteira do bolso e tirar o dinheiro. Ele insistiu:
Me dá ai qualquer coisa.
Desta vez tentou intimidar a A. e a mulher que bebia o coco. Vi que nessa hora o proprietário tinha pego o facão. Fiquei preparado para uma possível reação de ambos, pronto para avançar caso tentasse tomar a bolsa de uma das mulheres presentes. Um sentimento de ódio tomou conta, tinha vontade de chutá-lo, autocontrole nessas horas é importante. Isso fez que pudesse observá-lo melhor. Trata-se de um morador de rua, os olhos velhos, certamente, consequência de drogas , fedendo a merda e mijo – fendendo ao próprio cheiro da cidade. Depois que A. tomou sua água saímos. Olhei para trás duas vezes. O infeliz ainda insistia com a mulher que ficou, o dono do negócio dessa vez o enxota como se fosse um cachorro. Durante o caminho pensava nas possibilidades de saída àquela situação. Tinhas chegado a conclusão: “da minha parte, nenhuma”.
Algumas horas depois, já em casa pretendia sair, tomar uma cerveja gelada. Depois de alguns dias de fome, tinha o dinheiro mas, ninguém pra me acompanhar. Voltei a pensar naquele homem sujo e sem objetivo na vida, a não ser pedir algo à sua sobrevivência. Não tive razão ao ter raiva dele, porque pouca coisa me diferencia dele, muito pouca coisa. Ambos em algum momento é considerado a escória. Muitos amiguinhos, no habitual cinismo, quando riem ou trocam palavrinhas amigas nada mais fazem que esconderem todo o preconceito. Onde estão todos eles no momento como esse? Nas festinhas de aniversário, não me chamam porque sou tão sujo quanto àquele miserável, fudido na minha condição de quem viver sob a ajuda dos outros. Cometi um erro: não tinha me dado conta que era tão igual a criatura que todos repugnam pelo seu cheiro. É isso! Teria mais coisa a falar se não tivesse perdido a concentração por coisas banais, como sempre.
Nenhum comentário:
Postar um comentário